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O perfume e o trabalho

Embora eu ainda ache simplista a assertiva marxista de que a divisão social do trabalho é a base de toda e qualquer sociedade, tenho que admitir que se não é, poderia equivaler a uns 90% das razões por que fazemos coisas, temos coisas e inventamos coisas. Afinal, não é à toa que temos o bendito do dedo polegar opositor que tem capacidade preênsil.
Mas não vou falar de trabalho aqui. E sim de perfume.
O perfume é uma coisa antiga. Ou melhor, a noção de transformação de elementos para se adquirir odores que agradam ao olfato que é. Por exemplo, os egípcios costumavam fazer seu culto as Divindades através de fumaças perfumadas. E o perfume também já foi usado para prevenir doenças, algo como uma antisséptico da idade média, e claro, como objeto de higiene pessoal. E aí é que está o meu ponto de discussão.

Esses dias eu comecei a ler "Uma breve história do século XX" do Geoffrey Blainey. Quando ele busca apreender o espírito da virada do século XIX para o século XX, ele menciona muitos fatores, muitas atividades então típicas, e uma delas era exatamente a característica do trabalho, ainda baseado na labuta extensiva do meio rural, ainda muito sujo e insalubre nas grandes indústrias ao redor dos centros urbanos.
As ferrovias estavam se tornando o principal meio de transporte na Europa, e um dos trechos dele, após um relato sobre a higiene dos trabalhadores naquele período, foi o que mais me fez ficar pensativa de ontem para hoje, a ponto de decidir escrever um texto simples sobre o assunto: "Os perfumes quase sempre compensavam a escassez da água, e o corredor desse tipo de trem dispunha de uma máquina que, por uma moeda, liberava um pouco de água de colônia". (BLAINEY, 2010, p.26).


A ideia de perfume que temos hoje é exclusivamente como algo que acentua um status de beleza, de limpeza, mas principalmente de riqueza. Ter e usar perfume é uma espécie de rito que prova que somos pessoas da cidade, pertencentes a uma classe que se cuida, que se veste bem, que cheira bem e que tem poder aquisitivo. Embora, claro, haja uma rede perfumes baratíssimos, acessíveis a todos, convenhamos que existe, por outro lado, um verdadeiro exército de marketing, que através da sua principal arma: a propaganda, diz que não é qualquer perfume que te dá essas características de pessoa bem de vida, que mora na cidade grande. São perfumes X, Y e Z. Caríssimos e exclusivos.
Irônico a vida, que no início do século passado se vendiam doses de perfumes em trens pra amenizar o mal-cheiro de pessoas que trabalhavam em condições insalubres, e hoje ele é um produto única e exclusivamente de beleza, de "sedução". Um toque final de uma série de produtos e linhas para deixar você "feliz consigo mesmo" e parte de algo.





Um comentário:

  1. o perfume, marca, atenua, aumenta ou diminui a beleza/classe/modos?
    Eu acredito que sim...

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